Continuando a saga do aventureiro Natal José Dias, que ao lado de alguns companheiros, resolveu realizar um sonho antigo: percorrer as terras nordestinas a bordo de sua motocicleta. Foram 16 dias, 7.230 km rodados e 9 estados visitados (incluindo o Distrito Federal). Acompanhe a segunda parte da viagem nas palavras do próprio viajante

TEXTO: NATAL JOSÉ DIAS

FOTOS: DIVULGAÇÃO

Juazeiro

Oitavo dia, 352 km até Juazeiro do Norte (CE). Alternando, o grupo foi liderado pelo Luciano e Lady Simone a segunda, e Serra Fila com o Dercio. Rodando pela BR-122, alternando trechos de asfalto bom e ruim. Muitos perdidos, animais na pista e a caatinga seca (maravilha nossas visões pelo capacete). Ponte sobre rios secos e carcarás são uma constante. Destaque para as criações de cabritos (bodes), que apesar das cercas, insistem em escapar e comer não sei o que ao lado da pista. Um charme especial são as casas dos sertanejos na caatinga, cercadas por paus retorcidos da vegetação nativa, trançados como palha. Cisternas aguardando a chuva adornam o quintal. É bom conversar com os sertanejos, suas crenças, sotaque e humor ajudam a reduzir o cansaço. São heróis para sobreviver nesse sertão. Paramos em Exu (PE) – Terra de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, para fotos, hidratação e abastecimento. Grande estátua na entrada da cidade homenageia o mito. A divisa Ceará com Pernambuco não passou despercebida, recepcionados com uma grande panela (buraco) bem em baixo da placa divisa. Pequenas cidades e povoados, fazem parte da paisagem mostrando o dia a dia do sertanejo. Mantas de carne de gado, bode e carneiro são estendidas fora das casas para secar ao sol, isso repetido em todos os povoados e pequenas cidades dos estados. Serras e uma caatinga mais verde começava a fazer parte da paisagem do sertão cearense. Região do Cariri, cantada em prosa e verso por Raimundo Fagner. Crato e Juazeiro do Norte são grandes centros econômicos do Ceará. No Imperial Palace Hotel (Barbalha) fomos bem acolhidos. Confortável, bom restaurante (lento para servir) agradou pela cerveja gelada e variedades. À noite, como cortesia, o dono do ótimo restaurante Sirigado do Pedro – Juazeiro do Norte (CE), fez o translado ida e volta ao hotel. Comemoramos meu aniversário com direito a bolo e sorvete, uma surpresa de minha esposa Hilda e as garupas Simone, Suely e Lu. Valeu meninas!

Nono dia, passeios por Juazeiro do Norte (CE). Com a gentileza do Fray e sua boa organização de passeios, visitamos o Santuário do Padre Cícero. Estátua, museu, artesanato e medicamentos são as atrações. Shopping, mercado municipal, ruelas e comércio não deixaram de serem vistos. Fechamos o turismo com um almoço típico no restaurante temático “Coisas do Sertão”, uma atração à parte. Décimo dia, 586 km até Piripiri – Piaui. Foi um grande dia de estradas. O mais tenso, adrenalina a mil, forte calor e adversidades. Alternando estradas estaduais de boa e má qualidade, as travessias de pequenos povoados já se tornaram um trauma, com suas pedras, quebra-molas, falta de sinalização e pequenos trechos de terra até chegar à continuação da rodovia. Assaré, do Poeta Patativa, fez parte do nosso roteiro. Postos de combustíveis pareciam miragem. No entroncamento de Novo Oriente (CE) uma decisão: BR-407 mais longo ou BR-404 mais curto. Escolhemos o mais curto. Margeada por lindas paisagens da caatinga verde, longas retas a perder de vista pelas subidas e descidas, mais povoados e uma graciosa serra com suas curvas de 180 graus nos abraçou. Muita diversão, com direito a raspar as pedaleiras.

Num minúsculo povoado com ruas estreitíssima e uma ponte à ruir e um susto, fim do asfalto. Pasmos, paramos um veículo em meio a poeira e a pergunta: Quantos quilômetros de terra até o asfalto? É toda assim? Tem areia? Na verdade, era enfrentar os 40 km de costelas, pedras, areia e muito pó ou voltar. Enfrentamos! O grupo se dispersou na ânsia de vencer o desafio. Dois tombos, duas deitadas, um amortecedor quebrado, mais um salto de bota perdido, desidratação que me obrigou a parar a beira de um mágico rio e ser auxiliado pelos amigos Luciano, Simone, Dercio e minha esposa Hilda. O asfalto surgiu exatamente na divisa Piaui com Ceará. Uma experiência inesquecível para todos.

De tirar o fôlego!

Enfim, sem maiores danos materiais e pessoais chegamos ao buscado Piripiri (PI). O Hotel Califórnia, de baixa qualidade, foi o melhor encontrado na cidade. Tirando as bagagens das motos, adentra o cantor Marcio Greyck, que faria um show na cidade, ficando impressionado com a expedição do grupo. Encerramos a noite com uma boa cerveja gelada num botequim próximo. Décimo primeiro dia, Piripiri (PI). Consertos aqui e ali nas máquinas, ficaram apenas as cicatrizes do longo e agitado dia anterior. Visitar o Parque Nacional Sete Cidades organizado pelo Fray era o objetivo do dia. O parque, localizado ao norte do estado do Piauí, possui uma área de 6.221 hectares. Foi criado em junho de 1961 e é administrado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Região de transição entre Caatinga, Cerrado e Amazônia, pois está próximo à divisa com o Maranhão, distante 21 km de Piripiri (PI). É de uma beleza exuberante, suas várias formações rochosas de diversos nomes, tamanhos e formas, algumas muito altas, lembram castelos, edifícios, muralhas, pessoas, animais, mapas e objetos, é um mundo em pedras, porém seus riachos estão secos nessa época do ano, um gostoso mergulho numa piscina natural (dos milagres) não faltou. Encontramos também uma grande variedade de animais silvestres e inscrições rupestres de origem desconhecida. Existem vários mistérios, lendas, histórias relacionadas às “Sete Cidades de Pedra” – nome esse dado devido à divisão do parque em 7 grandes praças imaginárias. Muitos são os historiadores, pesquisadores e turistas que ao longo do tempo visitaram o parque e teceram seus próprios comentários a respeito do que viram. A Gruta do Catarina, onde viveu um curandeiro com seu filho especial isolado por muitos anos é uma delas.

Certo é que só em adentrar nos limites do parque sente-se um ar de mistério e admiração. Imperdível! Na entrada, um almoço “encomendado à caipira” nos fez saborear a típica comida piauiense, Galinha Capote, Galinha Caipira, farofa e outras mais. Passeio pela cidade de Piripiri, feira de artesanato, igreja e praça foram as atrações da tarde. À noite, cerveja bem gelada e boa comida no SystemaGryll, com direito à homenagem feita pelo grupo do simpático dono da casa, também motociclista, através do cantor no estilo voz e violão que se apresentava. Fechamos o ápice da expedição, agora retornar para nossas casas. Décimo segundo dia, 425 km até Floriano (PI). A BR-343 até Teresina-PI está em ótimas condições de tráfego. Predomina o verde da transição entre caatinga, cerrado e Amazônia, e cajueiros nativos floridos enchem a paisagem. O Clovis e sua esposa Aline, se deslocaram de Teresina para nos encontrar na estrada e nos comboiar pelo rodoanel, fugindo do terrível trânsito em obras da capital piauiense. Antes da BR, um trecho de 1 km de terra ainda fez parte da saga. Foi de grande ajuda, nossos agradecimentos ao casal.

Até Floriano, pequenos vilarejos, lombadas e a escassez de postos de abastecimento, porém, com asfalto em boas condições e as belas imagens da caatinga abraça a estrada num pouso do céu azulado, adornado com suas brancas nuvens no longínquo horizonte de subidas e descidas até onde a vista alcança. Num desses vilarejos, as lentes das câmaras flagraram vaqueiros sertanejos à beira da estrada. Uma mancha de óleo numa curva levou um piloto e garupa ao chão, já em Floriano, mas sem danos materiais e pessoais. Ao lado do Rio Parnaíba e divisa com o Maranhão, Floriano é um importante centro econômico para o Piauí. De boa estrutura, o Garoto Parque Hotel nos recebeu muito bem. Peixada e cerveja gelada foi o cardápio da noite. Décimo terceiro dia, e 730 kms rodados, o trecho mais longo de nossa expedição até Formosa do Rio Preto – Bahia. A BR-135 está com alguns trechos em reforma em terra, mas com ótimo asfalto, boa parte bem estreita, obrigando os caminhões a cruzar com outros veículos ou utilizar o acostamento. Muita atenção com animais na pista, de todos os tipos. Vimos tatu, tamanduá mirim, cobra, além dos bodes, jegues, vacas e outros.

Viva o verde!

A partir daí, predomina a caatinga, migrando do verde para seco e já próximo da divisa com a Bahia, e nota-se a derrubada da caatinga para formação de pastos e plantações. O bom trabalho do Dercio com a escolha dos hotéis nos levou à Vila Verde Chalés, às margens do Rio Preto, com estrutura para banho de rio, lanchonete, petiscos e boa cerveja gelada. À noite, um tour a pé pela pequena e bucólica cidade, ainda com seus casarios colônias, do tempo da cana de açúcar, nos levou a rua dos botecos, com mesas na calcada, lanches, espetinhos e um frio danado, isso mesmo, noite mais fria da jornada, marcando seus 16 graus às 22h. Décimo quarto dia, 525 km rodados até Alvorada do Norte (GO). Manhã fria e partimos para mais um trecho na BR-135 até Barreira (BA), onde novamente voltamos a rodar pela BR-242 até Luiz Eduardo Magalhães, e a partir daí BR-020, ambiente já relatados no início dessa expedição. Nesse dia, destaque para os inúmeros redemoinhos formados nas terras soltas das plantações, com enormes cones até as nuvens, retratados também pelas lentes fotográficas de nossas garupas. Desta feita ficamos no Hotel Luares, ao lado do Rio Correntes – atração da cidade. Noite com comida caipira típica goiana, especialmente encomendada.

Décimo quinto dia, 547 km rodados até Catalão (GO), ambiente já relatado no início dessa expedição. Paramos em Cristalina (GO), conhecida pelos seus cristais, para abastecimento e compra de cristais naturais.  Devido a sua pureza e qualidade, os cristais são transformados em instrumentos de ótica e em belíssimas peças de artesanato. Em Catalão (GO), Luciano e Simone seguem até Uberlândia, para reduzir o trecho que fariam no dia seguinte até Londrina (PR). Ficamos no mesmo Hotel Bristol. Décimo sexto dia e 537 km rodados até Rio Claro (SP), ponto de partida da expedição. A moto do Toninho perdeu pressão do pneu traseiro, defeito do bico, e os reparadores instantâneos ajudaram a chegar até um posto. Na borracharia, problema solucionado. Desse ponto, Dercio segue solo para Guarulhos (SP). Nosso último abastecimento da jornada, em Ribeirão Preto, liberou o Toninho para Sorocaba (SP), e o Sergio para Limeira (SP). O trio Natal/Hilda, Frasson/Ângela e Fray/Suely seguiram juntos até Rio Claro, com paradinha para lanche no Castelo, fechando 7.230 km rodados em 9 estados e o Distrito Federal, sem nenhum dia com chuva. Nessa expedição fica não só o sentimento de conquista, mas o fortalecimento da amizade e união do grupo nesses 16 dias. Formamos uma grande família!

Em poucas palavras, os integrantes da expedição expressaram suas opiniões:

Simone – Uma aventura inesquecível! Momentos marcantes, com pessoas que eu sempre quis viajar. Alegria nas plantações de Algodão e Cânions, e tristeza nos 40 km de terra com minha máquina.

Luciano – Surpreso com as boas estradas. Como em outras viagens, os amigos foram fantásticos, e mais uma vez, Simone me surpreendeu na pilotagem. Alegria quando resolvemos alugar os carros e tristeza nos 40 km de terra e minha escorregada.

Suely – Não foi apenas uma viagem e sim o prazer encontrado nas paisagens, passeios, aventuras e, acima de tudo, nos amigos. Alegria ao visitar Sobradinho e o mais tenso/triste os 40 km de terra.

Fray – Prazer e Aventura. Alegria ao visitar Canindé de São Francisco (Cânions de Xingó). Triste os 40 km de terra após Crateus.

Toninho – Excitante, inóspita e prazerosa, mais um desafio vencido!

Lu – Atração diária pelo desconhecido e o convívio com as pessoas. Alegria na Chapada Goiana e Diamantina e medo no trecho de terra, quando quebrou a suspensão da moto.

Ronaldo – Bons amigos, boas estradas, belas paisagens e cerveja gelada inesquecível. Alegria no encontro com o grupo na estrada e triste ao nos separarmos em Petrolina. Tenso com a perda de segurança nas estradas.

Sergio: A cor cinza da caatinga é bela, mas a natureza não faz nada em vão. Alegria na chegada de todos com segurança em Piripiri, e triste nos 40 km de costelas, stress total.

Dercio – Surpreso pelos desafios encontrados e pelas belas paisagens.

Frasson e Ângela – Frase Nordestina “Que nunca farte fé e coragi pra mode a gente nunca desisti dos nossos objetivos” (signos nordestinos). Achei nessa frase o que representou a Expedição Caatinga. E lá fomos nós com fé e coragem, na ânsia de conhecer de perto cada pedaço daquele chão.

Hilda – Medo e desencorajada de fazer de novo uma aventura como essa. Alegria nos grandes Cânions em Xingó e tristeza nos 40 km de terra.

Natal – Surpreso com tudo que encontrei. Feliz com a missão cumprida e o retorno de todos bem  para seus familiares.

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