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47 anos depois do fim da produção das twins, Interceptor 650 e Continental GT 650 estão de volta trazendo uma releitura do estilo clássico, mesclado à tecnologia contemporânea.

No início dos rebeldes Anos 60, uma parte da juventude britânica, mais especificamente de Londres, passou a se encontrar nas noites dos finais de semana no hoje lendário Ace Cafe para acompanhar os pegas de motos.

Naquela época, para ficarem com os reflexos preparados para a velocidade, a rapaziada parava no Ace e mandava generosas doses de café goela abaixo para então, acelerarem como se não houvesse amanhã.

Eram tempos em que as motocicletas da Royal Enfield – em especial, a Continental GT 250 CafeRacer – faziam um baita sucesso entre a rapaziada aficionada por ver o ponteiro do velocímetro dar a volta no painel. Essas motos fizeram a cabeça dos jovens por serem capazes de superar a marca das 100 milhas por hora (160 km/h) e também, por seu perfil agressivo, graças à posição de pilotagem esportiva mergulhada sobre o painel, contribuindo com a penetração aerodinâmica.

Nesta mesma época, a marca lançara a Interceptor, cuja primeira geração veio equipada com motor de 632 cm3, que posteriormente receberia um aumento na cilindrada para 736 cm3 com as Séries I e II. Voltada para o mercado norte-americano, era considerada uma moto muito potente para a época, superando os 175 km/h.

Apesar do sucesso entre os jovens, a marca enfrentava problemas financeiros e administrativos: em 1967 era fechada a fábrica de Redditch e três anos depois, foi a vez de fechar as portas da unidade de Bradford-on-Avon, colocando um ponto final na produção britânica da Royal Enfield e, consequentemente, destes modelos.

Renascimento

Sob a gestão dos indianos do EicherGroup, a marca renasceu e passou a resgatar o seu prestígio através de modelos clássicos de 350cm3 e 500 cm3. Em 2017, a Royal Enfield desembarcava no Brasil apresentando três modelos (Classic 500 e Bullet 500 e Continental GT 535), comercializadas através de um único concessionário, localizado em São Paulo.

Foi neste mesmo ano que, na Índia, a marca apresentava oficialmente as novas Interceptor e Continental GT, ambas equipadas com motores bicilíndricos de 650 cm3. 47 anos depois, a Royal Enfield trazia de volta estes dois icônicos modelos de maior cilindrada, mostrando assim, o apetite da marca para ocupar o seu espaço no segmento de clássicas em todo o mundo.

Por aqui as motos foram apresentadas durante um evento no final de janeiro, que contou inclusive, com as presenças de Vinod K. Dasari, CEO da empresa, e de Mark Wells, head de desenvolvimento de produtos e desenho industrial, mostrando a importância que estes lançamentos têm para a Royal Enfield e a relevância do mercado brasileiro para a marca.

Durante dois dias, tivemos a oportunidade de rodar mais de 480 km nas motocicletas, entre as cidades de São José dos Campos (SP) e Paraty, no litoral Sul do Rio de Janeiro, mas antes de falar sobre as impressões ao pilotá-las, vamos entrar nos detalhes técnicos de cada uma: isso irá ajudar a entender as particularidades e similaridades de seus comportamentos.

Exigência

Para trazer de volta as duas motocicletas, os indianos não pouparam esforços em investimentos, pesquisas, desenvolvimento e testes, afinal, eles tinham de criar motocicletas que fossem capazes de resgatar o espírito clássico das versões históricas, dotadas de elementos tecnológicos contemporâneos e capazes de conseguirem se sair bem em mercados tão díspares quanto Índia, Estados Unidos ou Brasil. E por fim, precisariam ser simples tanto em sua manutenção quanto no processo de montagem, já que a previsão da marca era de produzir 5.000 motos/dia, ou uma a cada 52 segundos!

Para isso, entraram em cena os engenheiros do novíssimo Centro Tecnológico do Reino Unido (United Kingdom Technology Center – UKTR) e da Harris Performance (empresa que pertence à Royal Enfield), que foram incumbidos pela direção da companhia para alcançarem os resultados estabelecidos.

Para chegar o nível de refinamento e qualidade almejados, as twins tornaram-se as primeiras motocicletas fabricadas pela marca a contar com processos industriais como AutoCAD, usinagem em tornos CNC, soldas robóticas e rigorosos processos de validação, os quais passaram a ser aplicados nas três fábricas indianas.

Mesma base

As duas motocicletas derivam da mesma base mecânica e ciclística: motor, quadro, suspensões, freios, escapamentos, rodas e pneus são compartilhados em ambas, mas apesar disso, cada uma tem sua própria personalidade, como veremos adiante.

Pautado pela simplicidade mecânica, o motor é um bicilíndrico refrigerado a ar de 648 cm3 que trabalha com intervalo de centelhamento entre os cilindros de 270o. Segundo Mark Wells, esta foi a configuração que ofereceu o melhor resultado entre desempenho, consumo e ronco, já que esta era uma característica que precisava lembrar as antigas versões das motocicletas.

Alimentado por injeção eletrônica, entrega 47 cv a 7.250 rpm e torque de 5,3 kgf.m a 5.250 rpm, dos quais, 80% estão presentes a partir dos 2.500 rpm, segundo a fábrica, enquanto que o câmbio de seis marchas conta com embreagem assistida e deslizante.

O quadro é fabricado em tubos de aço na configuração berço duplo e para chegar ao veredito nas suspensões, nada menos que dez diferentes modelos de amortecedor traseiro foram testados até se chegar ao bichoque escolhido, que tem curso de 88 mm e cinco possibilidades de regulagem da pré-carga; na dianteira o garfo hidráulico convencional tem tubos de 41 mm e curso de 110 mm.

Os freios são fornecidos pela Bybre, aquela marca que pertence à Brembo, voltada a motos de baixa performance: na frente o disco mede 320 mm e conta com pinça de dois pistões e atrás o disco é de 240 mm com pinça de pistão único, ambos assistidos por ABS.

As rodas são de alumínio, ambas aro 18″; segundo a marca, para atender aos fundamentos estéticos clássicos, e são calçadas por pneus Pirelli Phantom. A questão aqui é que só a Pirelli tem este pneu traseiro e, de repente, você estará na dependência de apenas uma marca na hora de fazer a troca.

Sutis diferenças…

Apesar de diferentes em poucos aspectos, são exatamente estes que são os responsáveis por deixarem as motos com aparências e comportamentos bem marcados e distintos.

A Continental GT 650 é uma CafeRacer de toque esportivo. Seus semi-guidõesclip-onfixos às bengalas e com pedaleiras recuadas promovem uma posição de pilotagem mais mergulhada sobre o tanque de linhas retas e com reentrâncias próximas ao assento para a acomodação dos joelhos e com capacidade para receber até 12,5 litros. A moto sai com assento em formato convencional em dois níveis, sendo que o tradicionalmonoposto será vendido como um acessório.

Já a Interceptor é uma legítima classicbike, com tanque de combustível em forma de gota, que traz suaves reentrâncias para os joelhos, assento onelevel recoberto com tecido de costuras quadriculadas e guidão alto, que proporciona uma pilotagem mais ereta.

Agora, um ponto curioso e até mesmo divertido, são os nomes das cores batizados pela marca: Black Magic, Dr. Mayhem, Ice Queen, Ventura Blue, Mister Clean, são as disponíveis para a Continental GT 650, enquanto que Baker Express, Mark Three, RavishingRed, Orange Crush, GlitterandDust e Silver Espectre são as que colorem as Interceptor GT 650.

Custando a partir de R$ 24.990 (Interceptor GT) e R$ 27.990 (Continental GT) mais frete, as novas twins da Royal prometem chacoalhar o mercado, já que custam bem menos que as concorrentes vendidas por Triumph e Ducati.

Como se comportam?

Quando o instrutor de pilotagem Francis Vieira comentou antes de iniciarmos o ride que as motos ofereciam até mesmo a possibilidade de uma tocada de caráter esportivo, confesso que em meu íntimo eu dei uma risada e falei: “êêêêêê Francis… Menos… Pega mais leve, man”.

Tive esta reação irônica porque, primeiramente, é preciso entender que estas não são motos das quais se deve esperar alta performance; pelo contrário, suas propostas clássicas visam o easyriding sem qualquer pretensão de ralar a saboneteira no asfalto. Sua ênfase é privilegiar o rolê descontraído das tardes de sábado, a baixa velocidade, tendo um sorriso dentro do capacete, alguém importante para você na garupa e alguns amigos rodando ao lado, sem ninguém precisar provar que toca mais que o outro.

E se você um dia já pilotou alguma moto clássica que deixou suas mãos dormentes, pode ficar tranquilo que isso não acontecerá com estas twins. Implantado inicialmente na Himalayan, há um sistema de contrabalanceiros presente no virabrequim que anula a inércia do deslocamento dos pistões, deixando o funcionamento do motor suave, porém, sem roubar-lhe o ronco grave e compassado. E sem formigamento!

Por outro lado, o bicilíndrico surpreende quando você quer dar aquela brincadinha mais atrevida. Embora a entrega de potência não tenha aquele punch de uma XT 660 (que tem apenas um cv a mais e 0,95 kgf.m a mais de torque), esta permite com que a motoca acelere com vigor a partir dos 6.000 rpm, possibilitando alcançar os 160 km/h em sexta marcha. E não estou aqui apenas me referindo a velocidade final, pois em curvas, ambas são divertidas, ainda que os pneus de perfil alto não permitam muitos abusos, entretanto, pode ficar tranquilo que você vai curti-las muito no primeiro rolê que fizer por uma estrada mais sinuosa. Vai por mim.

Sinceramente, eu não senti mais facilidade de pilotagem em nenhum dos modelos, já que ambos conferem facilidade nas trocas de posição para pendular em curvas e embora pesem 202 kg (Continental GT) e 198 kg (Interceptor), o conjunto ciclístico é tão acertadinho que você não sente este peso rodando a baixa velocidade; apenas nas trocas de direção que você não encontra a mesma agilidade presente em motos de concepção contemporânea.

Agora, eu nunca pilotei uma moto que tivesse um câmbio tão suave e macio como o destas motocicletas! Você mal faz força para apertar o manete de embreagem ou o pedal de engates, isso tanto na subida como na descida de marchas, enquanto que os freios estão muito bem dimensionados para a proposta das motos. As suspas trabalham bem na baixa velocidade, mas quando o caldo entorna, mostram-se moles demais na regulagem de fábrica, mas nada que uma beliscada na pré-carga traseira não resolva.

Enfim, concorrência tremei! A Royal Enfield coloca na praça duas motinhos que conjugam de maneira exemplar estilo, funcionamento e preço e certamente, vai abocanhar uma boa parcela de consumidores que gostariam de ter uma classicbike em suas garagens. E para oferecer um bom pós-venda, a marca garante que está preparada tanto em peças quanto em treinamento de mecânicos, para atender aos futuros proprietários com louvor, mas isso, só o tempo dirá.

Pois é, Francis, eu me precipitei! Foi mal.

Ficha Técnica

Motor: bicilíndrico SOHC, refrigeração ar e óleo

Cilindrada: 648 cm3

Alimentação: injeção eletrônica

Diâmetro x Curso: 78 x 67,8 mm

Potência: 47 v a 7.250 rpm

Torque: 5,3 kgf.m a 5.250 rpm

Câmbio: 6 velocidades

Chassi: berço duplo

Susp. Diant.: convencional hidráulica, 41 mm diâmetro, 110 mm curso

Susp. Tras.:bichoque, 88 mm curso, 5 regulagens pré-carga da mola

Freio Diant.:Bybre, disco 320 mm, pinça de dois pistões, com ABS

Freio Tras.:Bybre, disco 240 mm, pinça de um pistão, com ABS

Pneu diant.: 100/90-18

Pneu Tras.: 130/70-18

Peso: 198 kg (Continental GT 650)/202 kg (Interceptor 650)

Tanque: 12,7 l (Continental GT 650)/13,7 l (Interceptor 650)

Preço:  R$ 24.990 (Interceptor 650)/R$ 27.990 (Continental GT 650)