Lisboa–Vladivostok-90-dias–28-países–Parte-1-João-Luiz-asia-Itália-Andorra-França-Suíça-Mônaco-Nice-Cannes-2

Junto com mais quatro amigos, nosso leitor realizou uma das mais impressionantes jornadas que um motociclista pode empreender, conectando os dois extremos do hemisfério norte, por terra.

Texto e Fotos: João Luiz Marques da Silva

Após 10 anos de viagens de moto turismo e aventura pelo mundo, uma pergunta recorrente é: qual a melhor viagem que você já fez?  E a resposta, é sempre a mesma: a melhor viagem será sempre a próxima.

E como a melhor viagem será sempre a próxima, nos cabe a todo o tempo pesquisar, projetar, planejar, estudar roteiros, estradas, conversar com outros viajantes de duas rodas do Brasil e do mundo, para encontrarmos o local onde será a nossa próxima aventura.

E foi assim que aconteceu com essa viagem ímpar, saindo do Cabo da Roca, em Portugal, ponto mais ocidental da Europa continental, até Vladivostok, no extremo oriental da Rússia, bem próximo da China, Coréia do Norte e Japão.

O nosso grupo foi composto por mim e pelos destemidos, José Roberto Cápua, de São José dos Campos, Erik De Maria, de Bragança Paulista (titular da maior empresa de moto turismo do Brasil), Genecy Toti Júnior, de Piracicaba e Hamilton Reis, de Fortaleza.

Tudo começou um ano e meio antes, em uma reunião onde discutíamos de onde sair, por onde passar e aonde chegar. Deveria ser uma viagem de superação, desejávamos marcas e locais não habituais de outras viagens de moto que já haviam sido realizadas por outros, tinha que ser única, como assim ela o foi.

Um primeiro desenho, nos levaria de Londres (Inglaterra) até Magadan (Rússia), uma viagem de superlativos que faz parte de alguns roteiros de moto aventura. Mas não, nós queríamos algo mais, algo fora do convencional, quando então surgiram dois extremos que seriam interessantes: Lisboa Vladivostok. Com isso passamos a ter os pontos de partida e de chegada definidos. Mas só isso não bastava, não satisfazia nosso espírito de querer marcas sempre maiores. Foi quando começamos a enxertar pontos, cidades, países e regiões das mais diversas e não convencionais, e aí finalmente surgiram a partir de Portugal:

Espanha Gibraltar Itália Mônaco ­França Andorra Suíça Croácia ­Bósnia Eslovênia Eslováquia Montenegro Albânia Geórgia Armênia Irã Turquia Grécia Azerbaijão Letônia Estônia Lituânia Finlândia Cazaquistão Mongólia Rússia, com suas inúmeras cidades e pontos de visita.

Partida e emoções

Com todos os preparativos realizados e as motos (três BMW R 1200GSA e duas KTM, uma 1290 Adventure R e outra 1290 Adventure S) compradas em Portugal, a data escolhida para saída foi 03/05/19. Um misto de emoções brotaram nesse dia, as quais não foram fáceis de serem controladas; superaram nossas expectativas e mexeram bastante conosco nos primeiros quilômetros dessa grande viagem.

As paisagens e cidades da Espanha foram marcantes; uma rápida passagem por Gibraltar, um território inglês em pleno solo espanhol, com situações únicas como por exemplo, o tráfego na mão inglesa, dividir a rua com ônibus vermelhos de dois andares, e após cruzarmos uma pista de pouso, chegarmos ao famoso teleférico que nos leva a um mirante de onde se avista o continente africano através do Estreito de Gibraltar.

A sequência do caminho pelo belo litoral espanhol até a linda e importante Barcelona, coroaram os primeiros dois dias de viagem de uma forma muito especial, além de nos mostrar o que nos esperava dali para frente.

Continuamos nosso roteiro por Itália, Andorra, França, Suíça, Mônaco, Nice, Cannes, onde nos deparamos com uma frente fria totalmente fora de época, que nos fez enfrentar temperaturas de até menos 3oC, muita neve, passos fechados como o Stélvio, e a necessidade de refazermos parte do roteiro dadas as condições muito adversas e perigosas.

Para compensar esse que foi um dos temperos de nossa aventura, seguimos para o Leste Europeu e Bálcãs, locais amplamente recomendados para o moto turismo e onde o tempo abriu, o sol surgiu e vieram temperaturas de até 33oC.

Um dos vários países que merecem destaque nesse trecho é a Croácia, com sua bela capital Dubrovnik e cidades marcantes à beira do mar adriático como Split e Opatija; a partir daí, cruzar a Bósnia, Eslovênia e terminar o dia na inesquecível Kotor, em Montenegro, com sua linda baía e montanhas, foi algo extremamente marcante.

Quando já poderíamos nos dar por satisfeitos, fomos brindados por novas experiências incríveis na Albânia, uma das gratas surpresas e na Grécia, com sua capital Atenas, seu Pathernon e muito, muito mais, como Meteora, patrimônio da Unesco, em cujos picos encontram-se monastérios erguidos por cristãos que fugiam da invasão e da conquista do Império Otomano.

Como a Grécia sem suas ilhas, não é Grécia, fomos de navio até uma delas, no caso Santorini, que nos rendeu um capítulo à parte pela sua beleza natural, seu famoso pôr do sol, sua culinária marcante e outros atrativos para lá de especiais. Não dá para descrever a sensação de rodar de moto por lá.

Chegando à Ásia

De volta ao continente era chegada a hora de adentrarmos na Turquia, um dos pontos altos de nossa viagem. Em Istambul, sua capital dividida pelo Estreito de Bósforo, pudemos contemplar o Continente Europeu e já colocar as rodas das motos no início do Continente Asiático. Foi lá que completamos nossos primeiros 10.000 quilômetros rodados e onde fizemos nossa primeira revisão, com direito à troca dos pneus dianteiro e traseiro. Uma ótima experiência e oportunidade para conhecermos bastante Istambul, com suas mesquitas, palácios, mercados, bazares e uma diversidade imensa de histórias milenares.

Ainda em terreno turco conhecemos três locais fantásticos e altamente recomendados para o turismo: Hierápolis, a imperdível e apaixonante Capadócia e Adiyaman.

O que nos esperava pela frente não era nada mais, nada menos do que o Irã, uma das grandes expectativas de nossa viagem e um destino desafiador em função de tudo o que pensávamos conhecer desse misterioso país. Mas infelizmente não conseguimos entrar com as motos, graças a uma lei temporária (que depois de um tempo foi modificada) que proibia motos acima de 250 cc entrarem naquele país. Passamos perto de doze horas entre a tarde de um dia e a manhã do outro, tentando de todas as formas contornar tal situação mas acabamos desistindo dada a sua impossibilidade, mas não sem antes termos dormido em território iraniano, em uma hospedaria que renderia um capítulo à parte em toda essa nossa grande aventura sobre duas rodas.

Com esse percalço e essa frustração fomos obrigados a modificar nosso roteiro e programação pelos próximos dez dias, que era o tempo que passaríamos conhecendo e desbravando boa parte deste país. Assim, refizemos nossa navegação e seguimos para Armênia, Geórgia e Azerbaijão. E como foram bons esses próximos dias, que experiência vivida, que lembranças marcantes!

Tivemos muitas descobertas inimagináveis ao longo dos 90 dias de viagem. Duas entre tantas que merecem destaque, foram em países da antiga URSS, começando pela Geórgia e Azerbaijão, este, um país desconhecido por muitos – e também por mim –, que se tornou um dos pontos altos da viagem; sua capital Baku, é digna de elogios por ser surpreendente em função de seus extremos, que ligam seu passado ao futuro; sua arquitetura nos conecta a estes dois extremos de maneira impressionante. Tudo isso sem falar em sua beleza natural, seus parques, atividades ao ar livre, lazer e cultura tudo em um só local; um destino muito recomendado.

Para encerrar essa parte da viagem também passamos pela sofrida Armênia, que tem lembranças terríveis de conflitos, genocídio e muita história para ser contada. Para compensar esse lado, nos deliciamos com sua culinária farta e deliciosa. De quebra, uma bela visão do Monte Ararat, onde dizem alguns que foi o local de atracação da Arca de Noé após o dilúvio.

João Luiz Marques da Silva

   Administrador, trabalha no segmento do agronegócio, 61 anos, casado há 35 anos, pai de 4 filhos, avô de 2 netos e motociclista por paixão.