A bordo de motos Harley-Davidson, o empresário Lucio Peccolo, de 52 anos, viajou 8.500 km pelos EUA com sua esposa e um casal de amigos. Acompanhe nas palavras do próprio aventureiro como foi a saga

TEXTO E FOTOS: LUCIO PECCOLO

“Depois de quatro viagens maravilhosas, todas registradas nas páginas de Moto Adventure (edições 110, 123, 144 e 178), havia se passado mais de 18 meses desde a última. Foram meses difíceis para os negócios. Tínhamos, até então, a certeza de que, em 2107, não conseguiríamos realizar mais uma jornada.

Depois de pensar muito na vida, no que ela nos dá e o que levamos dela, cheguei para minha esposa, Fabíola, e disse que iríamos, sim, fazer mais uma viagem no meio do ano aos Estados Unidos. Ela, meio incrédula, questionou a viabilidade, visto que nossos rendimentos haviam caído de forma significativa e o novo custo com a faculdade de nossa filha também estava pesando contra. Fiz os cálculos, fechei os olhos e nos lançamos em mais um projeto.

Na sequência, falei com o casal Gonçalves, nossos parceiros na última viagem, em 2015, e eles também absorveram a ideia. Como eu, Vitor também não estava tendo ventos favoráveis que são reflexo de um país totalmente instável em que vivemos, mas traçamos um plano e começamos a colocá-lo em prática.

Como sou agoniado por natureza, já havia estudado minuciosamente há meses o roteiro, pois, sempre depois de uma viagem, já começo a planejar a próxima. Corremos atrás de promoções aéreas, hotéis, negociando aluguel das motos e, finalmente, comprando mais umas “verdinhas” e pronto. Estávamos só esperando o dia do embarque.

Dia 29 de junho partimos em direção a São Francisco, e dia 1º de julho já estávamos montados em nossas Harleys, alugadas de uma empresa especializada nesse tipo de negócio.

Demos o “start” nas magrelas e tomamos a I-80 pela Bay Bridge, na direção leste. A CA-108 foi a primeira grande surpresa da viagem. Uma estrada linda, ainda com o cume das montanhas cobertos de neve, curvas, inclinação, tudo que um motociclista gosta. Na primeira noite nos hospedamos em Walker, no Toiyabe Motel, onde os próprios donos (um casal de velhinhos) gerenciam o local. Logo na chegada eles nos receberam com quatro latas de cerveja Coors.  Uma simpatia!  Conversamos muito sobre negócios, política, carros, administração e vida.

Seguindo o caminho em direção ao norte, passamos pelo Lake Tahoe, CA-431, outra bela estrada, Lake Almanor com o Monte Lassen ao fundo. Infelizmente, devido ao inverno rigoroso daquele ano, houve acúmulo de neve em várias montanhas, entre elas o Monte Lassen e o Santa Helena, bloqueando as passagens por elas.

Com isso, tivemos que alterar por várias vezes nosso trajeto, circundando os pontos interditados. Apesar de frustrados, pois estradas em grandes montanhas normalmente são espetaculares, fomos presenteados nesse primeiro terço da viagem com duas obras da natureza. A primeira foi o Parque do Crater Lake. O visual deste lago, formado a partir de uma cratera, é algo esplendoroso, suas águas são de um tom de azul difícil de definir. Foi um dos locais mais lindos que tive o prazer de conhecer. A segunda foi o Parque do Mount Rainier, que é o ponto mais alto do estado de Washington e um dos mais altos dos Estados Unidos, com seus 4.394 metros.

A Stevens Canyon Road é a estrada que dá acesso à localidade de Paradise para quem entra no parque pelo leste. É uma estrada com bom grau de inclinação, com curvas fechadas que contemplam lindas paisagens como cachoeiras, lagos, penhascos e vários “Overlooks” que nos deixam extasiados.

Gasolina acabando… 

Por ter rodado muito dentro do parque, o nível de combustível caiu de forma dramática. No painel, a luz de advertência de pouco combustível havia acendido. O GPS mostrava o próximo posto a mais de 30 milhas da saída do parque. Já era final de tarde, estrada deserta, frio. Não tínhamos outra opção senão seguir em frente. Depois de uma breve subida, meu anjo da guarda novamente me estendeu a mão. Percorremos mais de 10 milhas de descida, e claro, coloquei em ponto morto e desci a serra só no embalo.      Sempre ficamos impressionados com a precisão do GPS nos EUA.  Exatamente no ponto indicado, no meio do nada, lá estava ele, um pequeno posto Shell com duas bombas nos aguardando. Que alívio!

Algumas cidades desta parte da viagem foram marcantes, como a própria Leavenworth e Hood River. São cidades pequenas do interior, porém, aconchegantes, bem estruturadas e particularmente belas.

Em seguida, passamos dois dias em Seattle, onde visitamos o Space Needle e o Public Market Center, entre outros, com sua variedade de produtos que deixa qualquer um com água na boca só de olhar. Este mercado público fica numa região bem turística de Seattle, onde há muitas lojas, restaurantes e o pier. E numa manhã de verão, num sábado, o volume de pessoas circulando é muito grande, parecendo um formigueiro.

Após Seattle, seguimos pela WA-20, passando pelos belíssimos Diablo Lake e Washington Pass. Outra cidade interessante foi a agradável Wallace, em Idaho, às margens da I-90 (outra bela Interestadual).

Seguindo ao sul, pegamos a US-12, sempre ladeada pelo Snake River.  Foram 190 km fantásticos, sendo outra bela experiência. A ID-21 foi passagem obrigatória. Trata-se da terceira vez que passo por ela, magnífica para quem gosta de curvas. Na chegada a Boise-Idaho, começamos a sentir a mudança na temperatura. Dos amenos 20 graus de média, as temperaturas foram subindo de forma galopante. Na chegada a Reno, o calor já começava a sufocar. No dia seguinte tomamos a I-80 sentido oeste. Pela manhã, a temperatura estava até agradável. A I-80, no trecho entre Reno e Sacramento, é muito linda e ótima para se rodar. Larga, rápida e um visual maravilhoso. Na altura de Auburn, pegamos a CA-49, que é estreita, sinuosa, com certo fluxo, mas muito charmosa, cruzando pequenas cidades e vilarejos.

Sequoias gigantes

O próximo ponto alto da viagem foi o Parque do Yosemite, onde podemos ver belas cascatas, o vale, bosques, desfiladeiros, rios e, claro,  o “El Captain” o maior bloco granítico exposto do mundo, além das sequoias gigantes. Foi um dia fantástico, pois, além de todas estas maravilhas da natureza, ainda rodamos ao sul do parque pela Wawona Road, com sua infinidade de curvas por entre o Vale das Sequoias.

O dia seguinte foi muito particular nessa nossa viagem. Primeiro, tive uma experiência fantástica na CA-190. Foi uma das melhores estradas em que já pilotei (curvas fechadas, inclinação, pouco movimento, bom estado do asfalto). A 190 é daquelas estradas que você, seguidamente, raspa a pedaleira da motocicleta. Um zig-zag, uma Disneylândia para quem gosta desse tipo de estrada. Sou um pouco afoito, não vou negar, por isso, Vitor já havia me dito anteriormente, no caso do Mont Rainier, para seguirmos em frente. Já era começo da tarde e o termômetro do painel já marcava 40 graus, quando entramos na US-395 sentido norte. Rodamos uns 75 quilômetros até pegar novamente a CA-190 leste, entrando no lindo, mas famigerado. Death Valley. Foram 177 km  de sofrimento. A temperatura não parava de subir,  42, 45, 48, 50, até chegar nos estúpidos 51,11 graus, fora a sensação térmica que, com certeza, passava dos 60 graus. O asfalto fervilhava!

Vegas à vista!

No dia seguinte nos encontramos em Vegas. Apesar da logística ter sido comprometida, lá estava o casal com sua Harley. Seriam dois dias em Vegas, então resolvemos fazer programas diferentes. Já que gostamos muito de montanha-russa, eu e Fabíola fomos ao Circus-Circus para andar em duas montanhas Indoor, localizadas num Dome naquele hotel.  Éramos duas crianças. Andamos três vezes em cada. Depois, seguimos ao New-York New-York para andar na Roller Coaster. Assistimos também ao show ONE, do Cirque Du Soleil, e o Worlds Greatest Rock Show (Show de Covers de vários artistas do rock), o básico passeio pela Las Vegas Boulevard, além de alguns dólares gastos em  caça-níqueis.

Fim da linha

Chegara a última parte de nossa viagem. Saímos de Vegas, sentido sul, pela I-15, cruzando a Reserva Nacional de Mojave, até chegar à I-40 seguindo ao oeste. Na altura da localidade de Ludlow, entramos em um trecho da Route 66 até chegar ao Bagdad Café, onde paramos para descansar e conversar com alguns franceses que estavam em uma excursão. Claro que as duas Harleys na frente do Bagdad Café em plena Route 66, foi motivo de muitas fotos tiradas pelos europeus.

Nosso roteiro previa a passagem pela Pacific 1, na região do Big Sur,  porém, devido ao deslizamento ocorrido em maio, ela ainda estava fechada. Foi uma pena! A Highway 1 é considerada uma das 10 estradas mais lindas do mundo. Pernoitamos, então, em Monterrey, onde seria nossa última noite antes de retornar a São Francisco. No dia seguinte, partimos cedo e chegamos perto do meio dia em nosso destino final.  À tarde, visitamos vários pontos turísticos, entre eles, a Golden Gate, Pier, Torre Coit e, claro,  que descemos a Lombard Street.

E assim se passaram 25 dias. São mais 25 para guardarmos de lembrança para o resto de nossas vidas. Agora é juntar mais um capital, escolher um dos quatro roteiros já pré-definidos e lá vamos nós novamente para mais uma grande aventura que, certamente, ficará em nossas lembranças para sempre.

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