Por Elas - Juliana Jacinto

À frente do Capital Moto Week, o maior festival de motos e rock da América Latina, Juliana Jacinto quebra barreiras e redefine o lugar das mulheres no motociclismo e nos grandes eventos. 

Texto: André Ramos

Fotos: Marcella Lasneaux/Vitor Brandão/Paulo Cavera/Divulgação CMW

Trajetória Profissional: Com mais de duas décadas de experiência em produção de eventos, como essa trajetória influenciou na concepção e evolução do Capital Moto Week?

JJ: Eu e o Capital Moto Week nos encontramos em um momento muito especial. O festival começou em 2004, mas entrou na minha vida em 2009, quando nos chamaram para assumir a produção. Eu e o Pedro, meu sócio, enxergamos um enorme potencial para crescimento e assumindo inteiramente a linha de frente do festival.  No ano seguinte, fomos para a Granja do Torto e, desde então, a estrutura não parou de crescer. 

Ao longo dos anos, vimos o festival crescer organicamente. Começamos em uma área de 150 mil m² e hoje ocupamos mais de 320 mil m², um complexo que se tornou a Cidade da Moto, por onde já passaram mais de 7 milhões de pessoas. O que antes era um evento local se transformou em um fenômeno, atraindo pessoas de todo o Brasil e do mundo. Conquistamos esse patamar por pensar fora da caixa e olhar com carinho para toda a cadeia de suprimentos. Consideramos a satisfação dos dos motoclubes, motogrupos, colaboradores, fornecedores, parceiros e de todos que estão envolvidos com o CMW. 

Enquanto o mercado falava de tipos de liderança, já tínhamos definido um estilo humanizado para liderar. O “Moto”, abreviação carinhosa, é esse sucesso porque ele é feito por pessoas e para pessoas. E cada um que integra o universo do CMW, seja público ou colaborador, precisa se sentir importante, pois, de fato, é fundamental. A chave do nosso sucesso é essa: quem vai ao festival sente essa energia e se conecta com ela. 

Origem do CMW: O que motivou a criação do Capital Moto Week e como foi o processo de transformar um encontro de motos no maior festival de motos e rock da América Latina?

JJ: O Capital Moto Week nasceu sem grandes pretensões, mas com um propósito muito forte: celebrar a paixão pelo motociclismo, pela liberdade, pela irmandade e pelo espírito de aventura e adrenalina. A primeira edição do CMW surgiu de um encontro de amigos motociclistas em 2004, para comemorar o dia do motociclista, no estacionamento do Estádio Mané Garrincha. Na época, tendo Sérgio Cruz como seu criador, 10 mil pessoas curtiram os três dias de programação. De lá para cá, sob todos os aspectos, o festival não parou de crescer. 

Por Elas - Juliana Jacinto

Com muito esforço e amor, o CMW se consolidou como o maior festival de motos e rock da América Latina e o 3º maior do mundo. Hoje, o CMW não é só sobre motos e rock. É um festival de lifestyle, de experiências, de encontros, reencontros e um espaço para todas as pessoas e famílias. O mais importante foi entender que o Moto tem um papel que vai além do entretenimento. Ele passa por aspectos sociais, culturais, de inclusão, de sustentabilidade, e muito mais. Buscamos sempre deixar um legado positivo para a comunidade e considero que a paixão pelo projeto foi o combustível para esta evolução. 

Desafios na Organização: Quais foram os principais desafios enfrentados ao longo dos anos na organização do CMW e como eles foram superados?​

JJ: Desde o início, acreditamos no projeto com uma visão de médio a longo prazo, uma vez que os números apresentados não demonstravam lucratividade na época. Na primeira edição sob nossa responsabilidade, fizemos mudanças na estrutura, segurança, serviços, entre outros, o que dobrou o orçamento do evento. Preparamos plano de investimentos baseado nos pilares estrutura, artístico e comunicação, apostando na profissionalização do festival. Aprimoramos ano após ano e fazemos isso até hoje. 

Por Elas - Juliana Jacinto

Um dos momentos mais difíceis foi a pandemia da Covid-19, que pegou todo mundo de surpresa. Em março de 2020, o CMW estava voando, tínhamos conseguido furar várias bolhas e a captação de patrocínios estava surpreendente e todas as bandas nacionais contratadas. Como todos, tivemos que pisar no freio numa sequência de passos. Foi um desafio gigantesco mantermos a marca ativa, criando ações, produtos e conteúdo para o público, que ficou dois anos sem nos visitar. Conseguimos superar essa fase com muito sucesso e um público recorde: 834 mil pessoas circulando pelo CMW 2022. 

Voltamos mais fortes, mantendo o DNA de um festival único e democrático. Nosso público é formado por 46,3% de mulheres e 53,7% homens, sendo 72% do total acima de 30 anos. Esperamos receber 800 mil pessoas na edição 2025, sendo 40% turistas de todos os estados brasileiros, com forte presença dos países da América do Sul, dos Estados Unidos e de países da Europa. O CMW que vemos hoje é fruto deste processo de amadurecimento da marca e da compreensão de que somos muito mais do que um festival de rock e motos. 

Para realizar esse mega festival, passamos por um planejamento de 11 meses envolvendo da estrutura e cenografia à acessibilidade e sustentabilidade. Contamos com uma equipe altamente qualificada e apaixonada pelo projeto. E o resultado deste trabalho poderá ser visto em breve, em mais uma edição surpreendente do CMW. 

Sustentabilidade: O CMW é reconhecido por suas práticas sustentáveis, sendo considerado um case de sucesso no Congresso Internacional Cidades Lixo Zero. Quais iniciativas de sustentabilidade foram implementadas e quais resultados já foram alcançados? ​
JJ: Nós enxergamos o CMW também como um espaço de transformação. Queremos mostrar que é possível fazer um festival tão grandioso, para quase 1 milhão de pessoas, priorizando diretrizes e ações socioambientais desde o planejamento até a desmontagem da Cidade da Moto. Somos o único festival do país a receber o certificado Lixo Zero, pela Zero Waste International Alliance, e o ISO 20.121, garantindo que toda a cadeia produtiva esteja alinhada às práticas ESG. Isso se deve ao nosso compromisso com o meio ambiente, que se reflete na atuação nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU. Na edição de 2024, por exemplo, foram mais de 90 ativações relacionadas à temática. 

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Durante os 10 dias de evento, foram geradas mais de 37 toneladas de resíduos sólidos, distribuídos entre recicláveis (26), orgânicos (8) e rejeitos (3), e conseguimos a impressionante taxa de desvio de aterro de 92,7%. Parte disso se deve ao uso exclusivo de embalagens compostáveis ou recicláveis, de copos retornáveis e à coleta seletiva, além da criação de um Centro de Triagem de Resíduos dentro da Cidade da Moto, em parceria  com a cooperativa Acoobraz, destinando corretamente os materiais para a reciclagem e compostagem. 

O CMW também é adepto ao Carbono Zero e busca não só zerar, mas ter saldo positivos nas emissões de gases do efeito estufa. Para isso, plantamos mais de 25 mil mudas de árvores, além da compensação da emissão de mais de 241 toneladas geradas com a aquisição de créditos de carbono na plataforma oficial da ONU. Ampliamos o impacto das nossas ações ao recolher resíduos eletrônicos na comunidade da Granja do Torto, que acolhe a Cidade da Moto, e incentivar o público a trocar resíduos por descontos nos ingressos. Desta forma, ajudamos com a destinação correta destes materiais.  

Nosso compromisso é contínuo e vai além dos dias de festival. A Academia de Produção Inteligente CMW capacita a cadeia do entretenimento para conduzir o processo da sustentabilidade, acessibilidade e diversidade. Mais de 50 profissionais se dedicam a essas três frentes ao longo dos 11 meses de planejamento, produção e realização do festival. Seguiremos atuando para reforçar ainda mais nossas práticas sustentáveis e promover um impacto positivo em todas as áreas de atuação do CMW, alinhado com o ciclo positivo dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030.

Impacto Social: Além de entretenimento, o CMW promove ações sociais, como a Vila do Bem, que oferece serviços gratuitos à comunidade. Como essas iniciativas impactam a sociedade local e qual a importância delas para o evento?
JJ: As motos e o rock são a essência do CMW e de um estilo de vida que também é pautado pelo impacto social. Durante a semana, a arena de shows dá lugar à Vila do Bem, com uma programação gratuita recheada de serviços de saúde, beleza, vacinação, atividades culturais, educativas e oficinas profissionalizantes. 

Criamos uma estrutura para receber parceiros como Na Hora, Sesc, Senac, DETRAN, Instituto Barba na Rua, Programando o Futuro, Secretaria da Mulher e Embaixadas, que oferecem serviços diversos à comunidade e a instituições carentes do Distrito Federal. É na Vila do Bem que o nosso coração pulsa, onde podemos reunir arte, cultura, serviços e o mais importante: pessoas para fazer o bem para outras pessoas. 

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Parcerias e Colaborações: Como é o processo de seleção e gestão das bandas e artistas que se apresentam no CMW, garantindo a diversidade e a qualidade das atrações musicais?​
JJ: Revelar a pluralidade e os talentos do rock nacional e internacional faz parte do DNA do CMW. Nos orgulhamos muito de abrir espaço para tantos artistas em ascensão e ficamos felizes de ver que eles também enxergam o festival como uma oportunidade única. Este ano, por exemplo, recebemos 1.300 inscrições de bandas que sonham em se apresentar no CMW, com materiais de 25 estados e do DF, além de artistas de países como Holanda, Portugal, Argentina, Bolívia, Colômbia, Equador e Uruguai. E mais, 84% das bandas inscritas nesta seletiva nunca se apresentaram no festival, comprovando o movimento de renovação do rock.

Na inscrição, eles enviaram música autoral e covers, release, imagens de shows e material midiático para avaliação. Agora, estes materiais passam pela análise da nossa curadoria, que é formada por produtores, músicos, artistas, publicitários e outros profissionais da cadeia da música e do entretenimento. Os critérios incluem nível de qualidade, autenticidade e expressão da banda, presença e desenvoltura no palco, além da sintonia com o público Moto Week. 

Sabemos que a seletiva de bandas é um dos momentos mais esperados pelos artistas, que produzem seus materiais e torcem para serem selecionados. Levamos este trabalho muito a sério, afinal, estamos falando de sonhos e do futuro do cenário do Rock. É por isso que, independente da fase alcançada na seletiva, todos os inscritos receberão devolutiva com destaques e pontos a serem aprimorados. Em maio as bandas selecionadas serão contatadas e será divulgado o line-up completo de todos os palcos.

Inovações e Futuro: Quais novidades estão sendo planejadas para as próximas edições do CMW e como você enxerga o futuro do festival nos próximos anos?​
JJ:
Para os que amam festivais e grandes encontros de moto, o Capital Moto Week é uma experiência diferenciada por sua atmosfera única! Como não poderia deixar de ser, temos uma grande preocupação com a curadoria musical. Do blues ao metal, todos os gostos são contemplados. São 10 dias e 5 palcos onde vão acontecer mais de 110 shows de bandas locais, nacionais e internacionais. Trabalhamos para deixar este cenário musical e a estrutura do Moto cada vez mais surpreendente.

Seguiremos investindo no contínuo crescimento do CMW visando fortalecer o festival como referência internacional em entretenimento, sustentabilidade e legados sociais. Planejo permanecer totalmente imersa no Capital Moto Week nos próximos 

anos, participando do planejamento, da produção, da construção, da montagem e tudo o que envolve a entrega do festival. Queremos entregar um CMW cada vez mais incrível para o nosso público, com a melhor experiência de entretenimento possível, conectando marcas e pessoas.  Além disso, outro grande festival deve sair do papel nos próximos anos. Mas isso ainda é segredo! Muitas coisas boas estão por vir! 

Liderança Feminina: Como é ser uma mulher à frente de um dos maiores eventos motociclísticos do mundo e quais conselhos você daria para outras mulheres que desejam ingressar no setor de eventos e entretenimento?​
JJ: Quando eu comecei no ramo de eventos, escolhi o caminho da produção, que exigiria meus conhecimentos, qualidades e competências, não da minha imagem. Então, nunca senti que o fato de ser mulher ou de ter determinada característica me traria vantagens ou desvantagens. Mas, infelizmente, vivemos em uma sociedade que ainda é machista. Como todas as mulheres, incluindo empreendedoras, encontro obstáculos, mas com persistência e capacidade supero todos eles. 

Como empreendedora, enfrentei os desafios que todos têm: encontrar exatamente o nicho de atuação; saber como me comunicar diretamente com o público; entender como fazer, como melhorar. Mas eu recebo muito carinho e respeito em tudo que eu faço porque sempre busco respeitar as pessoas, entendê-las, ser objetiva e clara. Essas características me ajudam muito a lidar com os desafios. 

Legado do CMW: Qual legado você espera que o Capital Moto Week deixe para Brasília e para a comunidade motociclística?​
JJ: Brasília é parte fundamental do projeto e a nossa expectativa é que o CMW contribua cada vez mais para que a capital se torne um hub de entretenimento, como vem despontando no cenário nacional nos últimos anos. Para nós, é motivo de orgulho falar dos impactos positivos que o projeto traz para Brasília. O CMW movimenta mais de R$ 62 milhões na economia, gastronomia e hotelaria da região, além de gerar 17 mil postos de trabalho diretos e indiretos. Nosso desejo é que o CMW continue amadurecendo e proporcionando uma plataforma de experiências que conecta marcas e pessoas. E mais, que continue trazendo pessoas de todo o mundo para visitar a Capital sob duas rodas e se encantar pela história, arquitetura e cultura únicas de Brasília

Mensagem aos Participantes: Que mensagem você gostaria de transmitir aos motociclistas e fãs que participam do CMW e contribuem para o sucesso do evento?​JJ: A todos os amantes do rock e das motos, queremos ressaltar que o CMW é um festival de todos. Essa atmosfera única da Cidade do Moto só é possível pela união e espírito de irmandade que reflete a essência da comunidade motociclistica. Durante 10 dias, o CMW se torna ponto de encontro para entusiastas das duas rodas e da música dos quatro cantos do Brasil e do mundo. Seguiremos pensando fora da caixa, trocando vivências e trabalhando com muita paixão para proporcionar uma experiência cada vez melhor, única e acessível ao nosso público.

Moto Adventure, a Revista dos Melhores Motociclistas.

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