Percorrendo caminhos pitorescos e inspiradores, viajantes fizeram uma verdadeira peregrinação de “motopaisagismo”
TEXTO E FOTOS: ROSA FREITAG
O Caminho da Fé é um trajeto de peregrinação com 900 km de rotas, em diversos ramais, dos quais 500 km atravessam a Serra da Mantiqueira. O ramal Águas da Prata-Aparecida, com cerca de 300 km, é atraente para o motociclismo de aventura, pois, em grande parte, percorre estradas de terra e serras com altimetria variável.
Fiz esse roteiro em janeiro deste ano, reunindo motos de várias cilindradas e um jipe. Marcamos o encontro em Águas da Prata (SP), em uma quarta-feira de manhã – um dia ensolarado, apesar do verão chuvoso. Saí de São Paulo com a BMW G650 X Country, junto com Bianchi Jr., de Honda Sahara 350; Roberto também saiu da capital paulista, a bordo de uma BMW R 1200 GS; Karla (com uma Yamaha Teneré 250), veio de Campinas; Adriano (de KTM 690), da vizinha Poços de Caldas; Klaus (de Troller), de Vinhedo; e Lucio (de BMW R 1200 GS), de Araraquara. Alguns eram velhos conhecidos; outros, amigos virtuais. Mas nosso objetivo comum era fazer uma peregrinação de “motopaisagismo”. Logo, nos tornamos uma equipe unida pela mesma fé.
Na Casa do Peregrino, é possível obter uma credencial para ser carimbada em pousadas ao longo do trajeto (esta, porém, não é válida para veículos motorizados). O último ponto de partida para reconhecimento do Peregrino do Caminho da Fé deve estar situado a pelo menos 100 km de Aparecida, e a última cidade que emite credenciais é Paraisópolis (MG).
Primeiramente, exploramos a região, passando por uma cachoeira e subindo até o Pico do Gavião, em Andradas. Iniciando a rota de peregrinação, nos divertimos em uma travessia de água e seguimos por estradas de terras planas e secas, cruzando com alguns ciclistas. A cada quilômetro há uma placa do Caminho da Fé com a contagem regressiva de kms até Aparecida – nosso primeiro marco indicava 302 km. Onde houver uma bifurcação, é certo que haverá uma seta amarela indicando o caminho correto. Paramos em Ouro Fino (MG), para fotos no “Menino da Porteira” e um almoço rápido.
DESAFIOS
Em Inconfidentes, Borda da Mata e Tocos do Moji, o caminho passa pela igreja matriz de cada cidade. Em Estiva, paramos para abastecer e Klaus e Bianchi se despediram – só foram para o bate-e-volta no mesmo dia. A partir daí, os trechos de serra são mais cênicos e curtimos o pôr-do-sol no belo trecho entre Cantagalo e Luminosa. Após 180 km, chegamos à pousada Dona Inês, na Serra da Luminosa, em Brazópolis (MG), e já estava escuro. Ela ajeitou um jantar e pediu que fizéssemos silêncio, pois os andarilhos e ciclistas dormem cedo e saem antes das 6h00. Na manhã seguinte, só sobramos nós, motociclistas, tomando café às 8h00. Saímos para o desafio de subir a serra íngreme, com cotovelos, erosões e trechos lisos. As motos pesadas tiveram mais dificuldade, mas nos saímos bem, sem “compra de terrenos”. Cruzamos a divisa MG/SP e saímos na estrada do Campista, em Campos do Jordão. Um trecho de asfalto com muitas curvas (uma delícia para pilotar!). Passamos por vários peregrinos a pé – aqueles que saíram antes do amanhecer, que acenaram, felizes.
Na divisa com São Bento do Sapucaí, a seta amarela orienta novamente para estradas de terra. Trecho bem úmido, com lama e erosões. Seguimos com cuidado, até nos depararmos com uma imensa árvore caída atravessando o caminho. Não dava para desviar, pois, de um lado, havia o barranco e do outro, o morro. Erguer as motocicletas para transpor exigiria um esforço imenso e poderíamos encontrar outros perrengues mais adiante. Decidimos abortar o roteiro ali e voltamos para o asfalto, descendo a SP-123 até a Dutra. Perdeu a graça, mas, mesmo assim, alguns seguiram até Aparecida.
Meses depois, voltei ao local da árvore tombada com uma Kawasaki 250cc e segui o caminho, entrando na cidade de Campos do Jordão. Segui as placas que indicam a quilometragem restante até Aparecida pela Avenida do Horto e desci a Estrada do Gomerale Pedrinhas até Guará. Há um trecho com alguns cotovelos e muitas pedras, mas vale a pena se aventurar e fazer uma pausa no deck panorâmico da Trutaria Bela Vista, providencialmente localizada onde acaba a dificuldade. Em outra ocasião, com moto de trilha, desci pela “Trilha da Santa”, saindo da SP-123 em Santo Antônio do Pinhal até a estação ferroviária de Piracuama, em Pinda. Esta é bem desafiadora: só pedras e degraus, boa opção para quem vai a cavalo!
O Caminho da Fé abriga muitos locais pitorescos: alambiques, pousadas, restaurantes, mirantes… E, no percurso, você sempre encontra gente boníssima para prosear, sejam peregrinos ou locais. Assim, é uma aventura interessante para se fazer só, sem ter aquela sensação de isolamento, e para voltar muitas vezes, com a certeza de novas descobertas!
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