Durante sete dias o motociclista paulista Rodrigo Tristão percorreu a bela região da mineira Catas Altas, ao pé de uma esplendorosa montanhas e incríveis atrativo

Texto e fotos: Rodrigo Tristão

Catas Altas, Minas Gerais

Catas Altas, embora seja linda, não é uma das cidades mais conhecidas do estado de Minas Gerais. Situada no trajeto da famosa Estrada Real, Catas Altas fica ao lado de ícones do cenário histórico brasileiro, como Tiradentes, Congonhas do Campo e Ouro Preto, cidades que normalmente atraem a maior parte dos visitantes da região. Pouco mais de 5.000 habitantes, privilegiados por morar ao pé de uma montanha de esplendoroso encanto, circulam pelas ruas de paralelepípedo de Catas Altas. Suas construções do período barroco, cuja arquitetura típica descansa à luz dourada de entardeceres lindíssimos, contracenam com a vistosa natureza serrana. Mas não foi por isso que o motociclista Rodrigo Tristão, morador de Descalvado (SP) decidiu viajar de moto por ali. Descubra nas palavras de Rodrigo como foi essa aventura.

CINCO MINUTOS

“Tive cinco minutos de inquietação quando assisti a um vídeo no Youtube sobre a Serra do Espinhaço. Como eu já estava com vontade de viajar, pensei que aquela região seria meu próximo destino. O passeio uniria um pouco dessa atmosfera histórica das cidades de Minas Gerais, àquela magia da natureza que circunda as grandes montanhas.

Havia dois tesouros para conhecer: o Morro da Água Quente e o Parque Natural do Caraça. De quebra, eu ia curtir trechos da legendária Estrada Real, conjunto de vias que somam um total de aproximadamente 1.600 km, construídos com o objetivo de fiscalizar o escoamento das riquezas do interior do Brasil para o litoral. Quem tentasse burlar essas vias acabava cometendo o “descaminho”, que hoje é o nome dado à infração popularmente conhecida como contrabando.

Ao conhecer algumas das cidades históricas de Minas, alguns trechos dessa linda estrada real vêm de brinde. Mas para ser sincero, o principal atrativo para mim era o magnetismo irresistível da natureza e das rochas que se erguiam imponentemente nas imediações da Serra do Espinhaço.

A distância era curta. De onde moro até Catas Altas são aproximadamente 750 km, o que me permitia viajar com bastante calma, de forma contemplativa, simplesmente para curtir aquela sensação gostosa do vento no peito, da liberdade e do sabor da aventura. Parti de Descalvado, cidade do interior de São Paulo onde moro, e percorri 500 km até Tiradentes, em Minas Gerais. Depois de dormir, acordei bem cedo para fotografar a igreja central. É muito bom cruzar as ruas e as construções históricas sem ninguém por perto. Apenas um cachorro me acompanhou por cerca de um quilômetro e até fez pose para algumas fotos. Depois de capturar essas primeiras imagens, voltei para a pousada e comecei a me equipar para percorrer 250 km até Catas Altas. Parece uma distância tranquila, mas depois percebi que era um trecho demorado. Saí por volta das 10h30. Após muito ziguezague nas montanhas, passando por várias cidades históricas, como Ouro Branco e Ouro Preto, cheguei ao Morro da Água Quente, cerca de 5 km antes de Catas Altas.

SURPRESAS

Entrei numa pequena vila que fica ao pé do morro e encontrei uma pousada paradisíaca. Chalezinhos dispostos no campo gramado, com a vista do morro ao fundo, davam a impressão de retiro e isolamento que eu tanto apreciava. Fiquei lá por várias noites. O bom é que da própria pousada já dá para apreciar as primeiras luzes do dia atingindo o morro, produzindo um espetáculo de cores cinematográfico.

Quando anoitecia, eu saía do chalé e ficava bastante tempo contemplando a luz da lua atingir o morro, ao mesmo tempo em que as estrelas cintilavam regiamente, fazendo uma espécie de moldura para um gigantesco quadro natural. Passei horas da madrugada observando, atônito, a via láctea se movimentando acima do morro, ao mesmo tempo em que a luz da lua produzia matizes muito bonitos nas rochas.

Visitei a Reserva Natural do Caraça, numa área particular de 11.233 hectares, onde fica a igreja Nossa Senhora Mãe dos Homens. O trajeto é sossegado e prazeroso, com várias curvas fechadas, gostosas para percorrer de moto. São cerca de 40 km em estrada asfaltada. No santuário do Caraça há um restaurante e também serviço de hospedagem. O passeio vale a pena tanto pelo trajeto ao lado das montanhas, como pelo prazer de pilotar ao lado de tanta natureza, numa estrada que fica no meio da mata. É gostoso ir com calma, chegar para almoçar, conhecer a igreja e os aposentos do santuário e tirar um cochilo num dos cantos bucólicos. Depois o negócio é voltar com toda a calma do mundo para o Morro da Água Quente.

É um passeio tão gostoso que aproveitei para fazê-lo duas vezes.

Bem pertinho de Catas Altas, num trajeto de pouca dificuldade por estrada de terra, a pouco menos de 10 km, fica a cachoeira da Santa. É um lugar adequado para ir, ficar um tempo e tomar um lanche. Se estiver calor, vale a pena entrar na pequena lagoa e tomar uma ducha. Fui sem nenhum guia, apenas com algumas informações que peguei na cidade.

DESAFIOS E PAZ

No outro dia conheci outra cachoeira, mas essa é acessível apenas para quem estiver com vontade de desafio. A Cachoeira do Maquiné fica perto da linha de trem. Para chegar a ela é preciso andar numa trilha, caminhar na beirada de um precipício e descer por um morro quase vertical pendurado num cano de água. Desta vez fui com guia, que contratei numa agência de turismo em Catas Altas. Antes de sairmos para o passeio, Nicolas, o guia, me perguntou se eu era acostumado a fazer trilhas. Respondi que sim, sem imaginar que o que ele queria mesmo era saber se eu era alpinista.

Quando chegamos ao ponto crucial, onde começa uma passagem (não chega a ser trilha) de uns 10 cm de largura. De um lado há uma parede de rocha e do outro fica um penhasco com mais de 10 metros de altura. Pensei em desistir. Isso nunca tinha acontecido comigo. Faço trilhas na natureza há mais de 25 anos e nunca me deparei com uma situação em que pensasse em desistir. Mas aconteceu desta vez. Disse para Nicolas que era melhor abortar o passeio. O risco não valia a pena. Com paciência, Nicolas me mostrou como vencer o desafio, me mostrando onde me segurar na rocha e indicando os apoios certos para descer até a cachoeira. Depois que ele demonstrou como fazer, minha coragem apareceu e decidi seguir em frente. Com cuidado e concentração, acabei superando esse obstáculo. Depois desci o morro apoiado no cano de água até chegar ao rio. Ainda foi preciso escalar algumas pedras para alcançar a cachoeira.

Finalmente pudemos descansar. O barulho da água caindo trazia uma sensação de paz enorme. Fizemos um lanche. Aproveitei para filmar e fotografar a Cachoeira do Maquiné. Depois voltamos. Consegui subir o morro e passar pelos trechos difíceis sem maiores problemas. Pegamos a moto, que eu havia deixado perto da linha do trem, e regressamos a Catas Altas.

Almocei num dos simpáticos restaurantes da cidade, dei umas voltas pelas ruas de paralelepípedo e comprei alguns mantimentos no pequeno supermercado. Logo depois segui pela estrada que regressava para o Morro da Água Quente, onde estava hospedado.

UM NOVO DIA

Depois de uma noite bem dormida, o dia amanheceu aquecendo o morro com uma luz rosada. Pouco acima, a lua desfilava sua magia no azul celeste. A missão deste dia seria conhecer a cachoeira da Valéria. Perguntei em alguns lugares como fazia para chegar lá.

Catas Altas, pelo que percebi, tem inúmeros atrativos naturais, incontáveis cachoeiras e trilhas. Mas o turismo da região baseia-se mais nos predicados históricos. Não há uma preparação para os viajantes mais interessados nas atrações puramente naturais. Não há sinalização adequada. É necessário perguntar e ter sorte para encontrar pessoas quando a necessidade de informação surge. No fim, acabei numa estrada de terra, por onde segui por aproximadamente 15 km. Cheguei a uma igrejinha e não havia placa alguma indicando a cachoeira. Por muita sorte encontrei um homem que andava por ali e ele me explicou que era dono da propriedade ao lado. Ele foi muito gentil em me permitir passar por sua propriedade e seguir a trilha até a cachoeira. Depois de receber suas instruções, segui a trilha e fui contemplando a paisagem com aquele sossego temperado pelo barulho da água do rio.

Assim que avistei a cachoeira, parei para descansar, fotografar e filmar. O tempo estava nublado e por isso as imagens perderam um pouco da magia. Mesmo assim foi gostoso estar sozinho em mais um canto especial do Brasil, apreciando o espetáculo infinito de belezas que surgem nessas viagens.

Voltei com bastante calma rumo à pousada, já que as distâncias eram curtas, e me preparei para iniciar o retorno para casa no dia seguinte.

INCRÍVEIS SENSAÇÕES

Com o amanhecer seguinte iniciei o percurso de Catas Altas para Tiradentes, onde pernoitei. Depois segui para Descalvado, percorrendo 500 km num dia de muita paz na estrada. Foi uma semana de descanso e contemplação, num percurso com poucas dificuldades técnicas e muita beleza natural e histórica. O Morro da Água Quente, em especial, é um lugar que jamais vou esquecer. O desfile empolgante das estrelas acima daquela magnífica escultura de pedra é uma das cenas mais lindas que já registrei. O mundo guarda surpresas formidáveis para quem quer desbravá-lo de moto, colocando o peito e o rosto no vento como uma das formas mais cativantes de saborear a vida.

Dados da viagem

Moto: Yamaha XTZ Ténéré 250 – performance de 26 km/l a 105 Km/h

Quilometragem total: 1.750 km

Duração: 7 dias

Vídeo da viagem: para assistir ao vídeo da viagem, acesse pelo Youtube com as palavras “Rodrigo Tristão Morro da Água Quente”.

*Matéria publicada na edição #190 da revista Moto Adventure.

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